domingo, 25 de maio de 2008

Trecho do livro "1968 - O Que Fizemos de Nós"

Leia o trecho do livro que será lançado por Zuenir Ventura na Bienal Rubem Braga:

A geração de 68, que dizia não confiar em ninguém com mais de 30 anos, está completando 40. Ainda dá para confiar nela? 1968 terminou ou não terminou? Que balanço se pode fazer hoje de um ano tão carregado de ambições e de sonhos? O que restou de tantos ideais? Muitos países que viveram a experiência estão tentando avaliar o seu legado, realizando o julgamento histórico de uma insurreição de jovens que pela primeira vez teve dimensão planetária, ou globalizada, como diríamos hoje. O que foi feito dessa herança?, pergunta-se aqui e em outras partes.
(...) Como eu ia dizendo... ou melhor, como eu disse há vinte anos na introdução de “1968 - O Ano que não Terminou”, a história que eu ia contar começava em um baile de réveillon antecipando simbolicamente aquele carismático ano bissexto que ainda se recusa a sair de cena. A festa foi o capítulo inicial, uma espécie de trailer do que viria em seguida: uma mudança radical ou, como querem muitos, uma “revolução”, talvez a única ocorrida naquele período que, politicamente, se pretendia tão revolucionário - a dos costumes.
Maria Clara Mariani, Marília Carneiro e Maria Lúcia Dahl são aquelas mesmas personagens marcantes do réveillon, do livro e do ano. Elas pertenciam a uma geração de jovens entre 20 e 30 anos que decidiu inaugurar um estilo de vida e experimentar formas alternativas de relacionamento que não reeditassem os compromissos matrimoniais impostos pelas convenções. Nada da hipocrisia dos velhos relacionamentos, nenhuma forma de dominação afetiva, não aos amores servis, fora com as imposições “burguesas” tais como ciúme, fidelidade, monogamia, virginidade. Eram tempos de utopia.
Quarenta anos depois, elas estão em torno dos 65 e são avós. Maria Clara não se casou de novo e tem sete netos; Maria Lúcia, atriz e cronista, voltou a se casar e a se separar, e tem dois netos; Marília é figurinista da TV Globo, teve dois casamentos e três netas. A ligação com a chamada “geração do milênio” permite às três acompanhar de perto as mudanças do tempo, sobre as quais aceitam estabelecer comparações, mas sem a pretensão de dar a última palavra.Elas acham que 1968 terminou, mas continuam falando com carinho dele. Maria Lúcia ainda se diz “apaixonada”, por ter sido o ano em que se decretou um “vamos parar de mentir”, “vamos parar de fingir ser uma coisa quando somos outra”. Segundo ela, “acabou aquela coisa de família com outra família escondida, de garçonnière para levar a amante, fingindo estar às mil maravilhas com a mulher”. Maria Clara não tem certeza se isso acabou mesmo. Considera que o grande avanço se deu no terreno da liberdade pessoal, que pode ser exercida diante de uma grande variedade de opções. Dá o exemplo de uma amiga que tem três netas: uma é ambientalista radical e mora na Austrália; outra freqüenta raves; uma terceira faz faculdade de Relações Internacionais.Já Marília prefere enfatizar o que é agora uma banalidade: poder se divertir. Divertir-se era, por exemplo, viajar, coisa que a profisssão hoje lhe facilita. Naquela época, sentia inveja dos homens que viajavam. “Meus maridos sumiam no mato; agora posso sumir no mato. Quer coisa melhor?”Maria Clara acha que a questão não era apenas poder se divertir, e sim não ter a vida pautada pelos outros. As meninas do século XXI, que podem passar as noites num botequim, acompanhadas ou sozinhas, não desconfiam de que houve uma época não muito distante em que uma mulher não podia freqüentar um bar sozinha.

Um comentário:

Ameríndio disse...

Tô lendo " O ano que não terminou ", a terceira edição... Beeeem antiguinha!

To adorando, e queria ler esse próximo, mas pelo que vi, só existe ele junto ao de 88 né?

Valeu!